Rio de Janeiro, 10 de maio de 2024.
Carlos Eduardo Drummond*
Sobre TEMPOS MODERNOS, o historiador João Daniel Almeida comenta no texto de apresentação que “o protagonista é o Palácio, e sua trajetória é esmiuçada deliciosamente desde muito antes de sua construção, quando ainda era uma ideia. Uma ideia de modernidade neta das Exposições Universais”. E completa dizendo: “Carlos Eduardo Drummond reconstrói a história das Exposições Universais — cada uma delas — desde 1851, em Londres, até 1922, no Rio de Janeiro. Isso tudo sem deixar de lembrar que, concomitantes às exposições, ocorriam até olimpíadas”. Em 12 capítulos (mais um Prólogo e um Epílogo), o livro percorre um arco de tempo partindo da aquisição do território da Louisiana — comprado pelos EUA da França, em 1803 — e vai até a polêmica demolição do Palácio Monroe, em 1976, lançando luz em muitos eventos históricos entre uma ponta e outra, no Brasil e no mundo.
Crédito da Imagem: Marc Ferrez, Palácio Monroe, 1912. Brasiliana Fotográfica, Instituto Moreira Salles.
Em sua pesquisa, o autor percebeu que não daria para contar a história do Palácio Monroe sem voltar no tempo para explicar a origem das Exposições Universais, grandes vitrines da modernidade que vinham sendo montadas na Europa e nos EUA, numa época em que o Brasil ainda não tinha se convertido em República, tampouco abolido totalmente a escravidão em seu território. A existência do Palácio Monroe se insere nesse contexto, pois sua primeira versão serviu de Pavilhão Oficial do Brasil na Exposição Universal de Saint Louis (EUA), em celebração ao centenário da compra do território da Lousiana, onde recebeu um prêmio.
Remontado no Rio de Janeiro no início do século XX, em pleno processo de modernização da cidade, com as obras da grande reforma urbana do Prefeito Pereira Passos em andamento, o Pavilhão Brasileiro finalmente ganhou seu nome definitivo em homenagem ao presidente americano James Monroe, idealizador da famosa doutrina “A América para os americanos”.
Praia de Santa Luzia; ao fundo, o Palácio Monroe, sem autoria, 1922.
Crédito da imagem: Brasiliana Fotográfica, IMS.
Cientes do atraso em relação às nações mais desenvolvidas, os governantes da época desejavam apagar a imagem colonial do país com ações que visavam propagar uma imagem moderna do país. Depois de realizar uma Exposição de âmbito nacional em 1908, no Rio de Janeiro, na qual o Brasil ganhou experiência no tema, o país se rendeu aos apelos de vários setores da sociedade para realização de uma Exposição Internacional em celebração ao Centenário da Independência. Inaugurada em setembro de 1922, essa Exposição teve o Palácio Monroe como Bureau Oficial de Informações e cartão de visitas para entrada de visitantes no setor Internacional.
Demolição do Palácio Monroe, 1976. Crédito da imagem: Senado Federal, Senado The Commons.
Até chegar a esse momento, no entanto, outras ações do governo foram executadas como pré-condições necessárias à montagem da grande Exposição. Assim, o arrasamento do Morro do Castelo, por exemplo, outra obra polêmica executada naquele período, também é abordada em detalhes pelo autor, pois é fundamental para entender o pensamento político da época e os desdobramentos que permitiram a montagem da própria Exposição.
Como é contado no livro, a maioria das construções citadas foi demolida. Até mesmo o Palácio Monroe, com todo peso histórico de ser um prédio premiado no exterior – em sua primeira versão -, e servindo ao país de várias formas, não foi poupado. Essa é, sem dúvida, a demolição mais polêmica e a que até hoje deixa muita gente inconformada. “Drummond não tem nome de poeta à toa. Ele resgata a sublime poesia da história imortal de um palácio que morreu.”, lembra o historiador João Daniel Almeida no texto de apresentação. A demolição aconteceu durante a Ditatura Militar, no Governo Geisel, que teve participação importante na decisão.
Demolição do Palácio Monroe.
Crédito da imagem: Senado Federal, Arquivo Público do Rio de Janeiro,
disponível na página Senado The Commons.
Carlos Eduardo Drummond, também autor do sucesso CAETANO – uma biografia (Seoman, 2017), relata que a ideia do livro nasceu em 2007, quando cursava uma Pós-Graduação em Relações Internacionais. O primeiro ímpeto foi escrever um livro sobre o Barão do Rio Branco, depois de assistir às aulas de História do Professor e Historiador João Daniel Almeida. Contudo, anos depois essa ideia foi abandonada e, no lugar dela, cresceu o desejo de pesquisar sobre o período fascinante abordado no livro, que inclui a tradição de montar grandes exposições, egressa do período industrial europeu e norte-americano, além da própria experiência brasileira de 1922 e, sobretudo, a indigesta demolição do Palácio Monroe, revela o autor.
Crédito da Imagem: Acervo do autor.
Ele conta que sempre se encantou pelo universo das grandes exposições. Ao mesmo tempo, se junta ao coro daqueles que não se conformam com a demolição do Palácio Monroe. Abordar tudo no mesmo contexto, com uma clara correlação entre os temas relacionados, é um dos grandes méritos do livro, pensa o autor. Especialmente o caso do Monroe é um tema que precisa ser lembrado de forma permanente. E vai além. Mais do que ser lembrado, o erro pela demolição do Palácio precisa ser reparado. Gerações vêm sendo privadas desse bem público de imenso valor histórico e ninguém até hoje realizou qualquer compensação. Em algum momento, esse Palácio precisa ser reconstruído, sonha o autor.
A investigação exigiu do autor rastrear documentos raros em instituições de pesquisa e memória, no Brasil e no exterior. Uma representante do Bureau International des Expositions (Paris – França) e o Presidente da 1904 World’s Fair Society (Saint Louis – EUA) foram alguns colaboradores importantes. Além desses, o americano Jerry Miller, colecionador de itens da Feira de Saint Louis, forneceu uma foto de sua coleção que está no livro. Outro desafio foi dar andamento às pesquisas durante a Pandemia, com as muitas restrições impostas para a sociedade. Mas o resultado valeu a pena.
Além de sustentar os fatos narrados ao longo dos capítulos, o montante apurado enriqueceu o conteúdo do livro com informações curiosas e consistentes, além de uma rica iconografia (por volta de 150 imagens), que inclui fotos raras, como a série da construção do Pavilhão Brasileiro em Saint Louis, localizada nos EUA, com ajuda dos americanos. Outro importante achado da pesquisa saiu do mergulho no arquivo Geisel, da Fundação Getúlio Vargas. Uma das atas das reuniões confidenciais do início dos anos 1970 revela que o Presidente Geisel fomentou uma campanha secreta, nos jornais da época, para criar artificialmente na opinião pública o desejo de demolir o Palácio Monroe. Mais uma herança funesta da Ditatura que vem a público no ano em que o golpe completa 60 anos. Essa informação sequer consta do volumoso processo do IPHAN que contém a farta documentação oficial produzida na época e que também foi esmiuçada pelo autor.
*CARLOS EDUARDO DRUMMOND é formado em Administração de Empresas pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e pós-graduado em Relações Internacionais pela Universidade Cândido Mendes (UCAM). Pesquisador, poeta, escritor — com quatro livros publicados, incluindoo best-seller “CAETANO – uma biografia” — e compositor de sambas de enredo de grande sucesso. É também servidor público federal da cultura.
DRUMMOND, Carlos Eduardo. Tempos Modernos – o Rio metrópole, a Exposição de 1922 e a incrível história do Palácio que desapareceu durante a Ditadura Militar. Rio de Janeiro: Litteris, 2024. Adquira o livro no site da editora Litteris, clicando aqui.
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